sexta-feira, 13 de dezembro de 2013
Será grave aprender a ler e escrever mais tarde? A opinião da Pedagogia Waldorf
Muitos pais ficam alarmados quando os seus filhos não aprendem rapidamente a ler ou escrever. E quando na escola os professores comentam "Parece que temos aqui um problema", então o alarme pode transformar-se em drama familiar.
Recorre-se rapidamente a entrevistas com psicólogos, testes, exames médicos, e finalmente aplicam-se planos de reforço ou coadjuvação do ensino. Mas será tudo isto realmente necessário?
A aprendizagem da língua materna e da aritmética são certamente pilares fundamentais da escolaridade. Mas conforme a nossa atual cultura tecnocrata, burocrática e "computocrática" exige cada vez mais uma competência prematura para "legibilidade" em todos os processos da vida, o adestramento literário ganhou um peso desproporcional e doentio no mundo da escolaridade inicial.
As crianças diferem grandemente entre si nas suas habilidades para aprender a ler. Algumas, consideradas minigénios, apresentam-se no seu primeiro dia de aulas prontas para demonstrar a toda a gente que "já sei ler e escrever", enquanto que outras escondem-se envergonhadas por não saberem nem desenhar muito bem um círculo para formar um "O". A aprendizagem da leitura não é nenhum procedimento técnico sistemático, mas sim um processo onde decorrem complexas interações sensoriais e intelectuais. Graças à moderna investigação médica, sabemos agora cada vez mais acerca da complexidade de tudo isso.
Personalidades de renome internacional na área das investigações neurocerebrais, como, por exemplo, Ernst Pöppel e Manfred Spitzer, estão a expor ao mundo a realidade de que o processo de aprender a ler é para uma criança de tenra idade algo profundamente não natural para o seu cérebro. Isto pode explicar em muitos casos aversões irracionais sentidas por alunos ou até mesmo o desastroso abandono precoce da caminhada escolar. Ao longo da evolução, o cérebro humano desenvolveu estruturas que em princípio seriam ideais para aprender a ler. Mas esse mesmo cérebro faz uma declaração aberta de antipatia perante o desafio de aprender a ler na idade infantil! O processo de ler pode mesmo provocar um bloqueio na capacidade de aprender sem esforço, e no prazer de recolher e processar informações. Assim, quando pretendemos auxiliar crianças com dificuldade de leitura, devíamos desde já tomar em conta estas descobertas da moderna investigação neurocerebral.
A capacidade de absorver informações escritas depende acima de tudo da capacidade de concentração. Sem a mesma, qualquer coisa captada pelos olhos em termos de leitura tende a permanecer nebulosa e incompreensível (veja-se o pavoroso analfabetismo funcional que, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD - de 2005, demonstrava que quase metade da população portuguesa não percebe o que lê ou tem dificuldade em entender completamente as informações que recebe). As crianças que não aprenderam previamente a concentrar-se, demonstram na escola uma quase automática dificuldade na aprendizagem da leitura. O filósofo Rudolf Steiner, inaugurador da Pedagogia Waldorf, expressou-se já em 1921 a esse respeito com as seguintes palavras: "Ensinar as crianças a ler e escrever da maneira despreparada que hoje se pratica significa basicamente introduzir as crianças de maneira totalmente artificial a algo que é estranho para elas."
Na Pedagogia Waldorf não há avaliações nem preparações prévias para a aprendizagem escolar, e a escritura é inicialmente aprendida através de um procedimento que envolve muita arte: fazem-se inúmeros exercícios de desenhar e pintar, treina-se a recitação oral e também as habilidades musicais. Ensina-se assim às crianças o escrever primeiramente a partir de uma captação artística das letras, e em seguida passa-se para a leitura a partir da escritura. Este processo baseia-se sobretudo nos exercícios de desenho de formas, durante os quais as crianças aprendem a compreender as nuances presentes em formas livres ou geométricas. A partir disto, elas irão alcançar uma criatividade autónoma para tais processos. A antropologia educacional profunda presente neste procedimento consiste na educação dos sentidos, para mais tarde compreender as formas das letras e saber reproduzi-las.
Que papel terá aqui a desempenhar a musicalidade? A Pedagogia Waldorf desenvolve uma combinação de musicalidade-vocalidade muito específica. Quando uma criança aprende a sentir a sua voz e avaliar o próprio timbre, ela estará mais bem preparada para compreender, no momento certo do seu crescimento, a musicalidade intrínseca das palavras. Muitas crianças não conseguem inicialmente diferenciar perfeitamente as vocalizações de "s" e "f" (como em "sinal" e "final"), mas com o auxílio de exercícios de recitação associados a canto, este e outros tipos de limitações são compensados desde muito cedo.
Numa escola Waldorf, após as crianças aprenderem a desenhar as formas artísticas isoladas das letras, é exercitada intensamente a capacidade de escrever, antes de se passar à leitura daquilo que a própria criança escreveu. No caso de crianças que neste estágio ainda não conseguem ler, o processo fica facilitado por exercícios de escritura de textos que previamente foram aprendidos a vocalizar de cor. A leitura de textos desconhecidos, impressos em livros ou revistas, ou aparelhos eletrónicos, é expressamente deixada para mais tarde. Se pais e professores não se deixarem afligir ou iludir pelo aparente "atraso" de uma criança, as competências em leitura e escritura podem depois serem facilmente alcançadas ao final do 2.º ano de escolaridade, sem esforço e sem a aplicação de intervenções artificiais.
Naturalmente, sempre há crianças que mesmo no final do 2.º ano ainda não dominam a arte da leitura, e que em comparação com outras também são insuficientes quanto à escrita. Geralmente é aqui que o sistema de ensino tradicional começa a designar tudo como uma "insuficiência séria e preocupante". Para a Pedagogia Waldorf, uma habilidade tardia em saber ler é na realidade muito menos grave do que forçar uma aprendizagem prematura da leitura. O procedimento de leitura exige uma aplicação de energias intelectuais. Mas se estas não estiverem já presentes de modo inato na criança, esse esforço deve ser evitado no primeiro seténio (os primeiros sete anos de vida), caso contrário a solicitação reforçada de atividade mental irá enfraquecer a saúde física e o equilíbrio anímico, que são precisamente o fundamento para uma ulterior metamorfose das faculdades mentais.
Há atualmente uma infinidade de métodos e exercícios (desde livros, manuais e baterias, até programas para computadores) para o treino precoce da leitura. Tudo isto baseia-se numa infeliz conceção educacional que reza que as futuras "aptidões" do adulto devem ser exercitadas o mais cedo possível. O desastroso provérbio "É de pequenino que se torce o pepino" demonstra com sabor folclórico a presença desta falácia, até no mais alto escalão do mundo educacional.
Sempre que são roubadas a uma criança energias que ainda não estão presentes congenitamente, a sua constituição física e anímica irá procurar compensar a perda dessas energias apelando a outros recantos da alma. Conforme a moderna ciência começa hoje a confirmar, um treinamento precoce da habilidade de ler pode ter em muitas crianças consequências negativas. Pais e educadores permanecem cegos para esta realidade, porque tais consequências só se irão apresentar num estágio posterior da vida, por exemplo na forma de uma pré-disposição para abstrações, o que por sua vez pode até explicar o aparecimento de estados escleróticos.
Conforme Rudolf Steiner explicou, as energias que tenham sido economizadas devido a uma aprendizagem tardia da leitura poderão inclusive revelar-se como positivas na vida adulta. Numerosas personalidades geniais em todo o mundo possuem na sua biografia um histórico de aprendizagem tardia da leitura e dificuldades com a escrita durante o período escolar. Na Pedagogia Waldorf não se tenta "fazer a relva crescer mais rápido puxando-a". Quando confrontado com uma criança que apresenta desvios da norma quanto à habilidade de ler e escrever, um professor dedica-se antes de mais nada a compreender a totalidade da vida interior e exterior da criança, tanto na escola como no lar. Ele procurará descobrir objetivamente e intuitivamente que peculiaridades ou genialidades estão presentes em estado latente na criança, para ela ser como é. Em muitos casos, encontra-se auxílio numa ocupação artística, ou numa atividade física salutar, após o horário escolar. O efeito destas atividades é em muitos casos imediatamente sentido na escola.
Para alguns educadores e pais, tais atividades extracurriculares podem parecer supérfluas, custosas ou impertinentes. Mas uma observação mais detalhada da prática educacional nas escolas Waldorf (e a Pedagogia Waldorf está agora próxima de celebrar um centenário de existência, com uma interminável expansão por todo o Mundo) demonstrará que nas chamadas "crianças difíceis" está sempre presente algo de extremamente individual, singular e original, algo que pretende expressar-se de algum modo, e que clama por mais atenção do mundo ao seu redor. O professor procurará então sempre que possível proporcionar à criança um espaço protetor na sua classe, e uma adequada atmosfera social no seio da comunidade escolar. Isto não é fácil de realizar, pois geralmente tem que se lutar com coragem contra preconceitos, hábitos empedernidos e falsas propostas científicas carregadas de puro utilitarismo e cegueira quanto à essência do que é um ser humano.
Mas quem se dedica com amor, intensidade e compreensão a esse tipo de crianças terá em pouco tempo a confirmação de que elas possuem, em estado embrionário, energias extraordinárias ou aptidões específicas que serão mais tarde apreciadas pela sociedade. Elas poderão demonstrar, por exemplo, uma capacidade de compaixão maior perante terceiros, uma sensibilidade intuitiva para os pensamentos e sentimentos presentes no seu meio ambiente, e uma expressividade superior em termos de imaginação e fantasia.
RAUL GUERREIROProfessor Waldorf; Membro do Conselho Nacional Parental Waldorf da Alemanha; Membro da Amnesty International.
Artigo publicado em 11-06-2013
Fonte: http://www.educare.pt/testemunhos/artigo/ver/?id=12596&langid=1
Foto extraída em:http://www.coisademae.com/2013/04/alfabetizacao-precoce-por-que-a-pressa/
quinta-feira, 10 de outubro de 2013
Dia das Crianças Sem Consumismo. É de pequeno que se aprende.
Campanha "Dia das Crianças sem consumismo. É de pequeno que se aprende" do Movimento Infância Livre de Consumismo - O Jardim Alecrim Recife apoia esta iniciativa! |
Queremos dar sempre o melhor para
nossos filhos e o Dia das Crianças, tão esperado pelos pequenos, pela indústria
e pelo comércio, é uma boa oportunidade para refletirmos sobre tudo aquilo de
bom e de melhor que podemos oferecer às nossas crianças. É um bom momento para
aprendermos a desconfiar daquele primeiro “eu quero” pronunciado efusivamente
diante da televisão ou da prateleira das lojas de brinquedos.
Parece clichê, mas é fato que o de
melhor que podemos dar aos nossos filhos não custa dinheiro, custa tempo e
disponibilidade. Tempo com corpo, alma e coração presentes nos momentos com
nossos filhos e disponibilidade para conhecê-los de verdade, assim como aos seus
desejos. Nossa proposta é aproveitar o Dia das Crianças para pensar junto com
as crianças sobre como diferenciar os nossos desejos genuínos e aqueles que são
implantados pela publicidade.
A publicidade trabalha com
sofisticadas pesquisas de mercado e age no nosso emocional focando as nossas
vulnerabilidades. Raramente vemos um produto – para criança ou para adulto –
que venda um atributo material: a publicidade atual vende atributos
intangíveis, valores que muitas vezes correspondem às nossas lacunas pessoais.
Então num anúncio de trem elétrico veremos a diversão da família sentada
vivenciada no tapete da sala ao redor do brinquedo. E é isso que a criança
quer: a diversão em família e não, necessariamente, o objeto anunciado.
O que está mais acessível? A vivência-brincadeira
em família no chão da sala ou o objeto-brinquedo caro na prateleira da loja? Do
que é mais fácil dispor? Tempo ou dinheiro?
Todo o marketing, todos os editoriais
e todas as colunas de comportamento repetem que não temos tempo. E, acreditando
que estamos sem tempo à nossa disposição, nos parece mais “fácil” trabalhar
ainda mais para conseguir o dinheiro para comprar o objeto-brinquedo e
satisfazer o suposto desejo da criança. E assim temos a tranquilidade de estar
fazendo o melhor. Estamos mesmo?
É essa a proposta do Movimento
Infância Livre de Consumismo para este Dia das Crianças: vamos trocar aquilo
que está em qualquer prateleira pelo tempo de qualidade com nossos filhos.
Vamos reduzir o número de objetos-brinquedo e vamos investir em vivências-brincadeira.
Vamos ensinar às nossas crianças algo que mesmo nós, adultos, temos tido
dificuldade de entender: que momentos vividos de corpo, alma e coração têm mais
valor que os objetos promovidos na tevê.
E vamos aguçar os sentidos para
perceber que estes momentos singulares e amorosos é que serão os que ficarão na
memória dos pequenos para sempre!
Publicado em: http://www.infancialivredeconsumismo.com.br/
terça-feira, 8 de outubro de 2013
Refletindo sobre o Brincar!
Crianças cavando um "rio" na caixa de areia - Jardim Alecrim Recife |
O que está acontecendo com o modo de brincar das
crianças?
Durante
as últimas duas décadas, temos progressivamente corrompido o modo de brincar
das crianças, assumindo o controle e alterando a cultura lúdica da infância.
Brincar é o portal da criança para o conhecimento de si
mesma e do mundo
Ao
reinventar a experiência brincando, ela dá significado e valor à confusão
estonteante da vida. O bebê transforma todo objeto que toca em algo a ser
sugado. Desse modo, passa a conhecer os limites de sugar e a natureza dos
objetos. Pela imitação de papeis adultos no jogo dramático, o pré-escolar
descobre novos potenciais e capacidades humanas. A criança em idade escolar
transforma objetos lúdicos, como peças do jogo de damas ou de xadrez e bolas de
futebol ou beisebol, em ferramentas valiosas de intercambio social. Todas essas
reinvenções contribuem para que ela amplie sua compreensão da realidade pessoal
e social.
Durante
as últimas duas décadas, entretanto, temos progressivamente corrompido o modo
de pensar das crianças. Temos feito isso assumindo o controle e alterando a
cultura lúdica da infância. Até pouco tempo atrás, havia uma rica linguagem e
um saber que eram exclusivos às crianças e que eram transmitidos pela tradição
oral. Eles consistiam de jogos, piadas, charadas, superstições e encantamentos
que foram sendo revistos pelas sucessivas gerações conforme as transformações
nas circunstancias sociais. Hoje, contudo, poucas crianças conhecem canções
como Rain, rain go away, come again another day (“Vá, vá embora, chuva, e volte
no outro dia” – Canção tradicional inglesa da época da Rainha Elisabeth I).
Elas também não entendem as palavras mágicas “Step on a crack and break you
back” (“Pise numa rachadura e quebre a espinha”. Segundo a superstição, comum
entre as crianças e originária do século XIX, pisar nas trilhas do calcamento
dá azar). As crianças contemporâneas conhecem, sobretudo a cultura da Disney,
Pokemón e Yogiyo, que nós, adultos, criamos para elas. Essa cultura lúdica
virtual é desonesta porque, embora se apresente como brincadeira de criança,
não é criada pelas próprias crianças.
Quando criamos brincadeiras para as crianças,
principalmente para as pequenas, apropriamo-nos antecipadamente de seu
crescimento. Nós as privamos das oportunidades de aprenderem
a seu próprio modo e em seu próprio ritmo. Isso não quer dizer que não tentemos
criar ou educar as crianças, mas apenas que o façamos de maneira que tenham
sentido, que sejam significativas e motivadoras para elas.
Eis um
bom exemplo de uma mãe, com todas as boas intenções, tentando interferir no
modo de brincar de seu bebê (Greoline, 1972, p. 13):
“Uma
jovem mãe senta-se junto ao berço de seu primeiro filho (para o segundo já há
menos tempo) e observa como ele tenta diversas vezes colocar um cubo vermelho
sobre um azul. Depois de certo tempo observando isso, ela pergunta: ‘E onde
está aquela sua bonequinha adorável?’. A criança abandona os cubos, procura a
boneca e começa a lamber o rosto dela, e fica lambendo, lambendo até a mãe
trazer o urso para a cena. ‘Grr, grr, aí vem o velho urso’. A criança brinca
com ele com as mãos e por fim mexe uma perna para cima e para baixo, até que, é
claro, a mãe entedia-se e chama a atenção da criança para a bola. Educadamente,
a criança deixa-se distrair pela terceira vez e brinca com a bola. Assim, a mãe
passa uma tarde agradável e está totalmente inconsciente de como ela interfere
na persistência e na capacidade de concentração de seu filho. Ela impede que
ele se acostume a perseverar em uma atividade e a se ocupar inteiramente com
alguma coisa durante um longo período de tempo”.
Isso
é exatamente o que acontece quando os pais de hoje colocam uma criança em
frente a uma tela de computador, ou lhes dão brinquedos que são tão programados
que deixam pouco ou nenhum espaço para a criança explorá-lo em seu próprio
ritmo e a seu próprio modo.
Efeitos do brincar virtual prematuro
Quando as
crianças são introduzidas no mundo virtual ao mesmo tempo em que são expostas
ao mundo real, ou até antes disso, brincar perde muitas de suas funções
adaptativas. Compare-se um bebê que sacode um chocalho para ouvir um som com
outro que aperta um botão para ouvir uma vaca mugir. No mundo real, sacudir um
chocalho realmente faz barulho, mas apertar um botão não faz uma vaca mugir.
Quando deixados com seus próprios recursos, os bebês descobrem o mundo físico
real. Como declara Richard Hartacher (1967, p. 27):
“Para o
bebê, os brinquedos são objetos experimentais totalmente apoéticos que servem
para explorar os santificados domínios da física. A exploração da física,
portanto, começa muito antes da escola secundária. Bola, chocalho, colher, tudo
cai no chão. Mas o som é diferente a cada vez. Pela repetição contínua, o
ouvido aprende a distinguir as diferentes qualidades do som produzido pelos diversos
objetos”.
Aprender
a operar no mundo virtual é, em certos aspectos, mais fácil do que aprender a
operar o mundo real. Ligar a televisão é um caso pertinente. Contudo,
grande parte do mundo da televisão não é a realidade. O brincar
virtual é corruptor porque impede a criança de adquirir muitas habilidades
pessoais/sociais e o conhecimento físico que só pode ser obtido brincando-se no
mundo real.
Quando os
adultos assumem o controle sobre as brincadeiras e os jogos das crianças, eles
necessariamente subtraem a capacidade delas de reinventar sua experiência. E é
somente através dessa reinvenção que as crianças são capazes de extrair todos
os benefícios do brincar para o desenvolvimento.
A
importância de “brincar de verdade”
A
despeito das afirmações acerca dos benefícios do Lapware e de programas como
Telletubbies, não existem dados que apóiem os benefícios intelectuais, sociais
ou comportamentais desse tipo de atividade virtual. Na verdade, a maioria dos
dados sugere que esses programas provavelmente fazem mais mal do que bem. Por
exemplo, temos assistido Vila Sésamo há mais de 30 anos. As crianças de hoje
conhecem números e letras em idade mais precoce do que nunca; porém, não estão
aprendendo a ler ou fazer cálculos mais cedo e melhor do que crianças que nunca
assistiram a Vila Sésamo. De fato, considerando-se o número de crianças que
estão sendo retidas no jardim de infância porque ainda não têm habilidades, o
aprendizado precoce pode estar tendo um efeito negativo.
Um estudo
de Hirsch-Pasek (1991) é instrutivo a esse respeito. A pesquisadora comparou
crianças que freqüentam pré-escolas acadêmicas com outras que freqüentam
pré-escolas centradas nas crianças e orientadas a brincar. As crianças que
freqüentavam as pré-escolas acadêmicas eram menos criativas e mais ansiosas do
que as que freqüentavam as pré-escolas que davam ênfase ao brincar. Elas também
gostavam menos da escola do que as crianças com as quais foram comparadas. Os
pré-escolares ensinados academicamente sabiam números e letras melhor do que o
grupo que brincava, mas essas vantagens eram dissipadas quando as crianças
ingressavam no jardim de infância???
Um estudo
mais recente, de Coolahan, Fantuzzo e Mendez (2000), oferece mais evidencias
sobre a importância de brincar no mundo real para crianças dessa faixa etária.
Esses pesquisadores constataram que as crianças que possuem competência para
brincar com seus amigos participam mais ativamente das atividades em sala de
aula do que as que carecem dessas habilidades. Na realidade, as crianças que
são inaptas para brincar são destrutivas ao brincar com os amigos e tendem a
apresentar problemas de conduta e hiperatividade na sala de aula. (Coolahan er
al., 2000). Essas são as crianças que mais provavelmente se ocupam com o
brincar virtual antes do real.
Evidências
ainda mais convincentes da importância de brincar provêm de outros países
ocidentais que fizeram experiências com instrução acadêmica precoce,
contraposta ao brincar no mundo real. Um relatório da Comissão Real Britânica
incluía o seguinte parágrafo (Commons, 2000, p 122-123):
“A
comparação com outros países sugere que não existe benefício em iniciar a
instrução formal antes dos seis anos. A maioria dos outros países europeus
admite as crianças à escola aos seis ou sete anos, após um período de três anos
de educação pré-escolar que se concentra no desenvolvimento social e físico.
Entretanto, os padrões de leitura e escrita e a capacidade aritmética costumam
ser mais elevados nesses países do que na Grã-Bretanha, a despeito de ingressarem
na escola em idade mais precoce”.
Os
efeitos de corromper o modo de brincar das crianças ficam mais evidentes quando
elas ingressam na escola. Aí que a falta de habilidades pessoais, sociais e
oriundas do brincar torna-se mais visível. Falta de respeito pelos professores,
intimidações, trapaças e incapacidade de concentração por longos períodos são
hoje lugar-comum. Esse novo ambiente social é, ao menos em parte, atribuível à
ausência de experiência lúdica no mundo real. Conseqüentemente, grande parte do
tempo do professor é atualmente dedicada à disciplina, em vez de dedicada à
instrução. E isso em uma época em que as demandas acadêmicas são maiores do que
em qualquer período anterior. Esta é apenas uma amostra das evidencias dos
efeitos negativos de impor realidades virtuais criadas por adultos às crianças
antes de elas terem lidado com o mundo real a seu próprio modo.
Com
certeza, sempre existiu alguma realidade virtual nas vidas das crianças
pequenas. Nos contos de fada infantis, existem animais que falam e que se
comportam como humanos, como em Os Três Ursinhos ou Os Três Porquinhos. No
entanto, essas histórias encontram correspondência no modo de pensar das
crianças pequenas, pois estas projetam qualidades humanas sobre os animais, de
modo que os contos de fada tendem a condizer com seu modo de pensar. Como
Bettelheim deixou claro, muitos contos de fada possuem um efeito terapêutico.
Os personagens da realidade virtual, contudo, são fantásticos e não coincidem
realmente com o pensamento infantil. Um bebê com uma tela de televisão na
barriga ou um homem-esponja não são personagens que as crianças evocariam
sozinhas. E é questionável se esses personagens terapêuticos. A necessidade
primordial dos bebês é estabelecer vínculos com adultos significativos, e não
com figuras bidimensionais animadas.
Reformando o brincar das crianças
Os
efeitos negativos de uma exposição prematura à realidade virtual são mais
intensos nos primeiros anos de vida. Precisamos limitar o tempo que bebês e
crianças pequenas passam em frente à televisão: no máximo duas horas por dia e,
se possível menos do que isso. Um bom kit de blocos de madeira é um dos
melhores brinquedos que podemos dar para uma criança pequena. Outros materiais
plásticos, como tintas e argila, oferecem, às crianças a oportunidade de
brincarem sozinhas.
As
experiências no mundo real são muito importantes para as crianças pequenas. A
jardinagem é uma grande atividade interessante, pois elas plantam e vêem
as plantas crescerem. Passeios ao ar livre e visitas a museus e aquários também
ajudam a colocar as crianças em contato com a natureza. Não vejo nenhuma
justificativa para colocá-las em esportes organizados ou individuais durante os
anos de pré-escola. Por outro lado, as crianças pequenas devem ter a
oportunidade de brincar com os amigos a seu próprio modo e com suas invenções.
Disponibilizar acessórios como roupas, chapéus e sapatos para serem utilizados
por elas em representações teatrais também são muito úteis. Em faixas etárias
mais avançadas, precisamos monitorar a televisão e o envolvimento com a
Internet e insistir para que as crianças tenham períodos de intervalo a fim de
brincar com seus próprios recursos. Estabelecer um horário semanal para brincar
em família é outro modo de garantirmos que as crianças aprendam as habilidades
sociais e intelectuais oriundas de brincar no mundo real, dedicado a jogar,
fazer uma tranqüila refeição em família ou visitar um parque, museu ou
zoológico.
O mundo
virtual da tecnologia moderna está aqui para ficar, e as crianças certamente
precisam aprender a viver e operar nele. Meu argumento é apenas que elas
precisam aprender e operar no mundo real antes de começar a viver e lidar com o
mundo virtual. É preciso ter raízes alem de asas. Brincar de verdade dá à
crianças as raízes; o brincar virtual lhes dá suas asas. Elas precisam de ambas
e na ordem certa.
David
Elkind - Doutor em Psicologia Clínica e professor de Desenvolvimento da
Criança na Tufts University, em Medford, MA (Estados Unidos).
Artigo publicado em: http://www.antroposofy.com.br/wordpress/o-que-esta-acontecendo-com-o-modo-de-brincar-das-criancas/
quarta-feira, 2 de outubro de 2013
PRIMAVERA (por Augusto dos Anjos)
Primavera gentil dos meus
amores,
— Arca cerúlea de ilusões etéreas,
Chova-te o Céu cintilações sidéreas
E a terra chova no teu seio flores!
Esplende, Primavera, os teus fulgores,
Na auréola azul dos dias teus risonhos,
Tu que sorveste o fel das minhas dores
E me trouxeste o néctar dos teus sonhos!
Cedo virá, porém, o triste outono,
Os dias voltarão a ser tristonhos
E tu hás de dormir eterno sono,
Num sepulcro de rosas e de flores,
Arca sagrada de cerúleos sonhos,
Primavera gentil dos meus amores!
Referência: Eu e outras poesias, LP&M, 2007, POA/RS
quinta-feira, 20 de junho de 2013
A Fogueira (Extraído do “Folclore Nacional”, de Alceu Maynard Araújo)
O fogo, na
simbologia alquímica, representa o puro espírito, aquele que aquece, purifica e
transforma. Ele está sempre presente em uma festa junina. Por meio dessa festa,
as escolas Waldorf no Brasil procuram resgatar um pouco do folclore de nosso
país.
O folclore exprime
o agir, o sentir e o pensar do ser social. Segundo Gabriela Mistral, nele “encontramos
tudo que é necessário como alimento ao espírito das crianças”. Seus valores são
múltiplos:
Valor físico: a
tradicional quadrilha e os jogos (pau-de-sebo, corrida do Saci, corrida de
sacos, ovo na colher, corrida de três pés, tiro ao alvo, etc.) contribuem para
a melhoria da coordenação motora.
Valor mental: as
histórias, as canções e as danças desenvolvem a atenção, a imaginação e a
memória.
Valor social:
enquanto brincam de roda ou dançam, as pessoas estão num estado de unificação
social, “caminhando juntas”.
Valor moral: ao
organizar a festa e participar dela, estimulam-se a solidariedade, a coragem, a
obediência, a iniciativa, o amor ao trabalho, a responsabilidade e disciplina.
Valor cultural: as
tradições transmitem idéias e costumes de uma geração à outra.
Valor recreativo: o
folclore oferece momentos de verdadeira recreação, atendendo aos interesses
infantis, juvenis e adultos.
Valor terapêutico:
participar de uma festa contribui para a eliminação de tensões nervosas e faz
esquecer aborrecimentos.
Valor cívico: a
criança passa a conhecer e a compreender o seu povo.
Valor religioso:
por meio de canções, lendas, histórias, são transmitidas as mensagens do
Evangelho.
Valor criativo: o
individuo traduz o seu estado de alma na construção de barraquinhas, na
confecção de bandeirinhas coloridas de papel seda, das lanterninhas, dos
alimentos característicos e na preparação do vestuário típico.
Fonte:
Insituto Mainumby. Festejar São João. Associação Comunitária Monte Azul.
sexta-feira, 17 de maio de 2013
A Festa da Lanterna
A Festa da Lanterna é uma festa de
origem europeia. Lá, é comemorada no dia 11 de Novembro, dia de São Martinho.
Foi introduzida no Brasil pela primeira Escola Waldorf de São Paulo, para o
Jardim da Infância, na época de São João.
No
hemisfério Sul, em Junho, estamos entrando no Inverno. Portanto, podemos dizer
que essa é uma festa que prepara para a chegada do inverno, época que
percebemos uma grande inspiração da terra, uma aquietação da natureza. O clima
fica mais frio, a noite chega mais cedo, tudo favorece uma atitude de
recolhimento e interiorização, de uma busca para dentro de nós mesmos, da luz
que vive no nosso interior.
Em
toda chegada de uma nova estação, buscamos direcionar novas atividades e
assumir uma postura coerente com as qualidades que a época inspira. Imbuídos de
sentimentos verdadeiros tornamos quase que tradutores dessas qualidades que a
natureza emana.
Quanto menores as crianças, mais sutis serão nossos gestos, mais plenos de imagens
serão os conteúdos trabalhados no dia a dia. O professor de Educação Infantil
pode ser um grande poeta que utiliza intensamente as figuras de linguagem a
favor das crianças, metaforizando aquilo que os pequenos só podem apreender
(e aprender) pelas imagens.
Precisamos cuidar para que a cada época, a cada celebração possamos despertar
aquilo que já está impregnado na alma humana e precisa, aos poucos, ser
“acordado”.
Esse
despertar é um processo natural da criança resultando num desenvolvimento
individual, à medida que, repetidamente, povoamos de imagens seus
corações. A celebração das festas anuais é um ótimo recurso de que nos valemos
para possibilitar aos pequenos essas vivências que lhes alimentam a alma
proporcionando sentimentos de alegria, amor, coragem, confiança e segurança
diante do mundo.
A
festa é preparada por integrantes da escola, inclusive pais e amigos. As
crianças presenciam e participam com muito entusiasmo e a alegria da confecção
das lanternas, aprendem músicas e escutam pequenas estórias e poesias
relacionadas ao tema.
Os
professores contam e podem até presentear as crianças com um lindo teatro da
história “A menina da Lanterna”,
cujas imagens mostram o caminho individual do homem em busca de luz interior.
Os personagens do texto nos revelam âmbitos do ser humano que necessitem ser
dominados, transformados e renovados. Lembremos que o fogo, desde os tempos
mais remotos, é o elemento da natureza mais usado por todos os povos para
simbolizar a transformação.
Durante a festa as crianças carregam suas lanternas passeando pelas áreas
abertas da escola simbolizando essa luz interior: o fogo divino e transformador
que todo o ser humano tem dentro de si. Trilhar esse caminho é uma prova de
coragem e a lanterna acessa é um estímulo que pode ajudar os pequeninos.
Caminhando juntos, todos cantam canções folclóricas que nos falam sobre o
homem, sobre a natureza, sobre o céu e a Terra e suas relações.
É
dever dos adultos, pais e professores, vivenciar a Festa da Lanterna com plena
consciência trazendo as crianças, com veneração, os sentimentos belos, bons e
verdadeiros pertinentes a essa época do ano.
Texto escrito por Sônia Maria Ruella (revisitado e adaptado por Maria de
Fátima Cardoso)
Fonte: http://festascristas.com.br/sao-joao-batista/sao-joao-batista-textos-diversos/670-a-festa-da-lanterna-sonia-maria-ruella
terça-feira, 26 de março de 2013
Páscoa
Todos os anos, na época do outono,
num jardim Waldorf, as crianças começam a se preparar para vivenciar
intensamente a primeira das quatro festas anuais, a Páscoa. Elas cantam lindas
músicas para o coelhinho da Páscoa; ouvem atentamente histórias sobre a lagarta
e a borboleta; pintam ovos com muitas cores; preparam, com a professora,
deliciosas roscas e pães. Todos esperam ansiosamente o domingo de Páscoa,
quando sairão em busca dos ovinhos de chocolate escondidos pelos cantos da casa
e do jardim. Nós, adultos, acompanhamos a alegria das crianças e
inevitavelmente nos transportamos para as nossas próprias recordações de
infância.
A Páscoa é uma festa repleta de imagens fortes e marcantes. Porém será que temos consciência do que há por trás destes símbolos? Será que sabemos nos preparar internamente para este momento tão importante?
Na tradição cristã, após os quarenta dias da quaresma e depois de refletir sobre os acontecimentos vivenciados por Jesus Cristo durante a Semana Santa (domingo de ramos, condenação da figueira, encontro com adversários no templo, unção, santa ceia, morte, descida ao reino dos mortos e ressurreição), os cristãos comemoram, no domingo de Páscoa, a glória da ressurreição de Cristo. Com sua paixão, morte e ressurreição, Cristo deixou-nos o precioso legado de uma nova vida após a morte, e quando seu corpo e sangue penetraram no mundo das profundezas, seu espírito possibilitou que a Terra, como um todo, se tornasse um novo centro de luz.
Dentro da pedagogia Waldorf, as crianças entram em contato com o sentido espiritual da Páscoa através de imagens transmitidas em histórias.
Por isso, durante a preparação das crianças para essa época, os educadores (pais e professores) devem ter claro dentro de si a possibilidade da vida, morte e ressurreição em hábitos, atitudes e modos de pensar. Se tivermos consciência da necessidade de cada um realizar este exercício interior, poderemos preparar coerentemente nossas crianças para a época da Páscoa e apresentar a elas símbolos repletos de significados. Só assim estaremos resgatando o real sentido da Páscoa.
A Páscoa é uma festa repleta de imagens fortes e marcantes. Porém será que temos consciência do que há por trás destes símbolos? Será que sabemos nos preparar internamente para este momento tão importante?
Na tradição cristã, após os quarenta dias da quaresma e depois de refletir sobre os acontecimentos vivenciados por Jesus Cristo durante a Semana Santa (domingo de ramos, condenação da figueira, encontro com adversários no templo, unção, santa ceia, morte, descida ao reino dos mortos e ressurreição), os cristãos comemoram, no domingo de Páscoa, a glória da ressurreição de Cristo. Com sua paixão, morte e ressurreição, Cristo deixou-nos o precioso legado de uma nova vida após a morte, e quando seu corpo e sangue penetraram no mundo das profundezas, seu espírito possibilitou que a Terra, como um todo, se tornasse um novo centro de luz.
Dentro da pedagogia Waldorf, as crianças entram em contato com o sentido espiritual da Páscoa através de imagens transmitidas em histórias.
Por isso, durante a preparação das crianças para essa época, os educadores (pais e professores) devem ter claro dentro de si a possibilidade da vida, morte e ressurreição em hábitos, atitudes e modos de pensar. Se tivermos consciência da necessidade de cada um realizar este exercício interior, poderemos preparar coerentemente nossas crianças para a época da Páscoa e apresentar a elas símbolos repletos de significados. Só assim estaremos resgatando o real sentido da Páscoa.
O significado da Páscoa
A Páscoa não é uma festa totalmente terrestre. Ela depende de acontecimentos cósmicos. É comemorada no primeiro domingo após a primeira lua cheia que ocorrer depois do equinócio de outono, marcado pelo ingresso do Sol em Áries. Por isso não tem uma data fixa.
A Páscoa é sempre comemorada no domingo, mostrando uma relação com o Sol, astro que rege esse dia da semana. Também tem relação com a Lua cheia. Lembremos que a Lua não tem luz própria, refletindo a luz que recebe do Sol.
Então, a Páscoa nos remete diretamente à elevada entidade espiritual do Cristo. Intimamente ligada a forças solares, às forças da vida. Cristo venceu até mesmo a morte do corpo físico. Essa é uma imagem que podemos tomar como exemplo para nós e seguir um caminho de salvação da “alma”. A meu ver, esse caminho é da tentativa constante de compreensão do Mistério do Gólgota e da Ressurreição do Cristo, que nos leva a um encontro interior com este elevado ser. Isso não significa, necessariamente, seguir uma religião institucionalizada. Para mim, significa seguir um caminho religioso (religare) que nos leva para dentro de nós mesmos, interiorizado, através da persistência, dos estudos espirituais e da meditação.
A Páscoa nos aproxima, pela consciência, da morte e da ressurreição. Sugere uma assimilação na alma das forças de ressurreição de Cristo, forças de vida que vencem a morte.
Talvez seja um momento até de estarmos em transformação, pois, transformação implica na morte de algo velho para que o novo possa surgir. E um novo baseado em ideais que muitas vezes deixamos “adormecidos”.
A Páscoa não é uma festa totalmente terrestre. Ela depende de acontecimentos cósmicos. É comemorada no primeiro domingo após a primeira lua cheia que ocorrer depois do equinócio de outono, marcado pelo ingresso do Sol em Áries. Por isso não tem uma data fixa.
A Páscoa é sempre comemorada no domingo, mostrando uma relação com o Sol, astro que rege esse dia da semana. Também tem relação com a Lua cheia. Lembremos que a Lua não tem luz própria, refletindo a luz que recebe do Sol.
Então, a Páscoa nos remete diretamente à elevada entidade espiritual do Cristo. Intimamente ligada a forças solares, às forças da vida. Cristo venceu até mesmo a morte do corpo físico. Essa é uma imagem que podemos tomar como exemplo para nós e seguir um caminho de salvação da “alma”. A meu ver, esse caminho é da tentativa constante de compreensão do Mistério do Gólgota e da Ressurreição do Cristo, que nos leva a um encontro interior com este elevado ser. Isso não significa, necessariamente, seguir uma religião institucionalizada. Para mim, significa seguir um caminho religioso (religare) que nos leva para dentro de nós mesmos, interiorizado, através da persistência, dos estudos espirituais e da meditação.
A Páscoa nos aproxima, pela consciência, da morte e da ressurreição. Sugere uma assimilação na alma das forças de ressurreição de Cristo, forças de vida que vencem a morte.
Talvez seja um momento até de estarmos em transformação, pois, transformação implica na morte de algo velho para que o novo possa surgir. E um novo baseado em ideais que muitas vezes deixamos “adormecidos”.
Helena Maria de Jesus
terça-feira, 19 de fevereiro de 2013
Pedagogia Waldorf: um bem social
Escrito por Dr. Paulo Neves Júnior
Poderia um médico opinar sobre pedagogia?
Minhas filhas estudam em uma escola de Pedagogia
Waldorf: a Escola João Guimarães Rosa. Ribeirão Preto tem a
oportunidade de ter a pedagogia mais indicada para ser oferecida às crianças, e
por isso ofereço minha visão a respeito.
A perspectiva do que é o ser humano do ponto de
vista da Antroposofia pode ser retirada dos textos do Antroposofiando.
Quem quiser acessar os artigos é só clicar no site do Peregrino, no
setor de Antroposofia. Quem quiser ir atrás de mais literatura, veja os sítios
na internet da Editora Antroposófica (www.antroposofica.com.br) e João de Barro
(www.editorajoaodebarro.com.br).
No início de minha vida profissional demorei a
compreender o que Rudolf Steiner propunha ao dizer que uma pedagogia exercida
de forma correta teria um caráter de medicina preventiva. O que uma coisa tinha
a ver com a outra? Eu me perguntava. Hoje entendo perfeitamente o que ele
dizia. Uma pedagogia antroposófica propõe o ensino de acordo com a
fenomenologia do desenvolvimento das crianças. Steiner lançou as bases dessa
concepção pedagógica e quando a vejo sendo praticada dou-lhe plena razão. A
Pedagogia Waldorf é mais do que levar uma proposta de saúde às crianças.
Baseado na minha observação assim eu aponto:
- observo a professora cumprimentar individualmente
a criança ao entrar na sala de aula: a criança aprende a ser saudada, a ser
considerada e já recebe, portanto um primeiro contato no dia. As crianças fazem
fila para isso e aguardam pacientemente a sua vez. Recebem um gesto de atenção
individual, consideração, e aprendem a ter paciência, captam um exemplo de
educação;
- as salas de aula têm número pequeno de crianças.
Significa que o professor tem mais condição estrutural de conduzir o grupo e
naturalmente há mais disponibilidade para atender as demandas individuais;
- as crianças pequenas não são avaliadas pelas
formas das clássicas provas: não são levadas a uma situação de estresse tão
habitual em nosso meio. Não são instadas a produzir sob essa forma de pressão.
E não deixam de aprender por isso! E não formam adultos que só produzem sob
pressão;
- a metodologia Waldorf se utiliza do recurso da
fantasia para o aprendizado. Os instrumentos da arte permeiam todo o ensino, o
caráter e a identidade do método. Isso estimula a criatividade além de evitar
que sejam incutidos quaisquer conhecimentos de caráter unilateralmente
abstrato. Resulta que as crianças aprendem a correlacionar o conhecimento com o
real fenômeno das coisas. Isso evita um ensino baseado unicamente na memória,
em que o que é passado para ser aprendido não faz sentido. Seja na conexão dos
conhecimentos, seja no porquê daquilo. Como reminiscência, lembro do quanto me
perguntava enquanto garoto do que me serviria aquilo que era obrigado a
aprender, além de que a escola era uma chatice só...;
- para tal, entre outras ações, também a escola põe
no currículo, viagens anuais relacionadas ao conteúdo de cada ano. Uma
oportunidade de aspirar e vivenciar um conteúdo vivo, palpável, real (num mundo
repleto de estímulos virtuais = não verdadeiro);
- Minha filha mais velha usou de uma tarde inteira
para me confeccionar um presente de aniversário. Ninguém a estimulou para isso.
Ela tomou sua decisão, bolou o “projeto” e realizou a obra por completo. Afora
minha satisfação por esse carinhoso presente, ela demonstrou iniciativa,
criatividade e capacidade de execução. Eu sei que isso provém da Pedagogia
Waldorf, que é baseada em estimular as crianças a criarem soluções que partam
de si mesmas. Por isso tenho dialogado com ex-alunos de escolas de ensino
Waldorf e tenho colhido relatos do quanto eles tendem a buscar soluções por
livre iniciativa. As crianças são conduzidas a buscarem alternativas de
resoluções por si mesmas, então é o ensino de aprender a aprender. E não o de
repetir padrões ou usar de métodos bolados por outros. Que é a camisa de força
tão comum em nossa sociedade. Caso das provas, não é? Onde se recebe maiores
notas, por quanto mais se consegue apenas repetir com maior
fidelidade aquilo que foi introjetado. É o equívoco de valorizar as pessoas
multiplicarem padrões, o que enfraquece o afloramento das riquezas das
diversidades e heterogeneidades individuais;
- quem for a Escola João Guimarães Rosa não pode
deixar de olhar para o espaço e a arquitetura. O ambiente foi idealizado em
compatibilidade com a sua forma de ensinar. Há uma forma orgânica, com
movimento que “diz” algo de positivo aos seres humanos ali presentes. A
arquitetura se nutre da mesma visão da pedagogia, buscando um todo harmônico;
- durante o percurso escolar das crianças ao longo
dos anos, os pais são estimulados a participarem de diversas ações relacionadas
aos seus próprios filhos e à comunidade escolar em geral. Enquanto nas escolas
convencionais os pais pagam para não terem responsabilidades, nas escolas
Waldorf, eles pagam para serem participativos. A estrutura de gestão praticada
leva os pais a serem co-responsáveis por todas as atividades escolares. As
festas são realizadas pelos professores, funcionários e pais. As alegrias, as
satisfações, o engajamentos dos pais com a finalidade pedagógica leva às
crianças exemplos de um acompanhamento conjunto e cuidadoso;
- o que sempre foi praticado, e que era um exemplo,
virou lei no terreno pedagógico convencional: as crianças especiais são
colocadas junto às crianças sem distúrbios, desde pequenas. O que isso leva?
Uma natural observação de um ser em crescimento a ver que outras pessoas têm em
si uma inerente dificuldade. Já de cedo se oferece a
oportunidade de aprender a lidar com as diferenças, de ter tolerância, de lidar
com posturas e ações colaborativas. E no decorrer do tempo, fica muito claro, o
quanto as crianças que necessitam de cuidados especiais também são beneficiadas
por esse processo;
- a música faz parte da rotina escolar, reforçando
a premissa da arte. Suas manifestações elaboradas e adquiridas por cada classe
são demonstradas para o público escolar nas chamadas festas semestrais. Ali se
pode apreender um pouco do que é praticado dentro das salas de aula. Para mim
que não fui aluno de um aprendizado Waldorf, essas festas são momentos tocantes
por toda a beleza em sentido mais amplo, aí configurado. Percebo que para o
grupo fazer uma apresentação musical, as crianças precisam prestar atenção às
outras e sincronicamente saí o resultado de um trabalho de grupo, um exercício
de coletividade, onde o amálgama musical junta as diferenças de cada um para
formar uma conjunção harmoniosa, com muito treinamento e esforço implícito ali.
Enfim, a música entre outros bens espirituais que nos traz, estimula a criança
a ser disciplinada;
- as atividades escolares são elaboradas para
oferecer uma evolução cognitiva, de acordo com o patamar de desenvolvimento
neurobiológico das crianças. Esse bem de imenso valor sugerido por Steiner
molda a forma de atuação dos professores: os ensinamentos somente são dados a
partir do momento em que o ser humano, naquela fase de crescimento infantil,
apresenta-se pronto para acolher o aprendizado. Então nada é levado a uma
precocidade tão em voga atualmente. É como se a criança dissesse: agora estou
pronta para aprender algo novo e com complexidade diferente. Isso não gera
atropelamentos no desenvolvimento infantil e é prevenção para Disfunções
Cerebrais Mínimas, por exemplo;
- outro bem: não há estímulos para competição. Há
uma segura linha de ensino onde observo que as crianças vão evoluindo em
conjunto no adquirir dos novos conhecimentos e com reflexo no comportamento
social. Outro dia tive a ótima oportunidade de ver os adolescentes, em fase de
saída da escola por estarem terminando seu ciclo, irem brincar de maneira
organizada, com as crianças do primeiro ano. Presenciei uma sensível
manifestação de alegrias mútuas devido àquela interação;
- Assim a Pedagogia Waldorf, não prepara os seres
humanos para a competição, por exemplo, o vestibular. Ela prepara os seres
humanos para a vida, para as suas escolhas individuais. Conduz os adultos a
resolverem problemas de maneira criativa e partindo de uma livre iniciativa.
Quem sabe de seu valor não precisa competir com o outro, não precisa medir
forças, não precisa derrubar o oponente. Quem se autodetermina, tem autoestima
e certamente adoecerá menos.
Caso alguém queira olhar para os “resultados” da
metodologia Waldorf, leia sobre “Os sete mitos da inserção social do ex-aluno
Waldorf”, pesquisa elaborada pelo casal de pais da Escola Waldorf Rudolf
Steiner de São Paulo, Wanda Ribeiro (socióloga) e Juan Pablo de Jesus Pereira
(engenheiro civil e empresário), disponível na home-page da Sociedade
Antroposófica no Brasil (www.sab.org.br).
Clínica Médica e Reumatologia Antroposóficas / Consultor
Biográfico
Fonte: http://www.alumiar.com/educacao/39-antroposofia/704-pedagogiawaldorfumbemsocial
Assinar:
Postagens (Atom)